Corpos Virtuais para Drogas Reais

Os testes clínicos tradicionais precisam de bastante investimento monetário e de muito tempo para que se tenham garantias de que o novo produto vai ser aceite pelas entidades reguladoras. Para além disso, existem perigos associados aos testes médicos feitos em animais e/ou humanos. E se fosse possível reverter essa situação? 

Com o uso de inteligência artificial bem como com a otimização de simulações e os avanços que têm vindo a surgir na medicina personalizada, pode existir a possibilidade desta reversão através de testes clínicos in silico.

O termo “testes clínicos in silico” indica o uso de simulações informáticas individualizadas no desenvolvimento ou na avaliação de produtos, dispositivos ou intervenções médicas.

Assim, não é necessária a utilização de material animal, nem uma única célula e mesmo assim poder-se-ia estudar o impacto de qualquer terapia ou medicamento. Existem três processos associados: a modelação, a simulação e a visualização de processos biológicos e médicos em computador. 

Através da modelação mapeiam-se os elementos de um sistema biológico. A simulação tenta mostrar de forma realística a evolução do sistema devido a um determinado estímulo. A visualização devolve as previsões graficamente. 

A maior vantagem destes testes deve-se ao contexto das simulações: os efeitos de novas drogas ou opções de tratamento são estudados virtualmente sem consequências reais em qualquer tipo de animal. Para além disso, também acaba por se tornar uma vantagem para a medicina personalizada, uma vez que estes procedimentos vão permitir que os médicos testem planos de tratamento, conhecendo melhor o comportamento das drogas e identificando a dosagem mais apropriada para cada paciente.

Este novo procedimento permite a construção de sistemas circulatórios, neuronais, endócrinos ou metabólicos e estes podem de seguida ser combinados para permitir a examinação do corpo humano como um todo. Os resultados finais serão mais rápidos e mais flexíveis, permitindo também uma redução de custos.

Virtual-Humans

Já há vários exemplos promissores que mostram o potencial para que os testes clínicos tradicionais acabem por desaparecer nos próximos anos. Um deles é a HumMod, que se revela como uma das mais avançadas simulações até à data. Fornece um modelo da fisiologia humana desde órgãos inteiros até a moléculas individuais. Contém mais de 1500 equações e 6500 variáveis tais como fluidos corporais, circulação, eletrólitos, hormonas, metabolismo e temperatura da pele, permitindo simular o funcionamento da fisiologia humana. Vários projetos de investigação já o usam para, por exemplo, criar uma população heterogénea de milhares de pacientes virtuais apenas ao variarem aleatoriamente os parâmetros fisiológicos para examinar o quanto uma massa renal reduzida pode influenciar a hipertensão sensível ao sal.

Enquanto os testes clínicos completamente simulados não são praticáveis com a tecnologia atual e com o conhecimento biológico que se tem, continua a esperar-se que o seu desenvolvimento tenha maiores benefícios do que os testes realizados atualmente e a FDA (U.S. Food and Drug Administration) já se encontra a planear um futuro em que mais de metade da informação obtida em testes clínicos provém de simulações informáticas, visto que ninguém vai querer realizar testes em animais ou humanos se tiver a possibilidade de medir com precisão as consequências de novos medicamentos ou caminhos de tratamento virtualmente. 

Apesar disto, tem que se mencionar que as entidades reguladoras vão enfrentar um novo desafio: irão ter que permitir que mais e mais medicamentos personalizados, mais baratos e mais eficientes entrem no mercado sem serem testados em humanos por anos.